Inovação Digital: A Nova Era no Combate à Malária

Inovação Digital: A Nova Era no Combate à Malária

Nos escritórios em Maputo, Nampula ou em qualquer outra província de Moçambique, era comum ver gestores públicos envolvidos na implementação do Programa Nacional de Controlo da Malária, cercados por pilhas de relatórios em papel e planilhas para analisar. O cenário incluía tabelas, gráficos inacabados, números dispersos. 

Cada campanha — fosse de distribuição de redes, pulverização ou quimioprevenção — gerava muita informação. Porém, elas estavam dispersas, muitas vezes armazenadas em folhas de papel ou planilhas isoladas, longe do alcance daqueles que mais precisavam delas para agir com rapidez e precisão. 

Era como tentar montar um quebra-cabeça, mas nem sempre era possível encaixar todas as peças. As decisões acabavam chegando tarde. Recursos eram investidos em atividades repetidas. Algumas aldeias ficavam sem cobertura. E a malária continuava fazendo vítimas.“Todos os instrumentos de registros eram feitos manualmente e levavam muito tempo para chegar até o Ministério da Saúde, pois os distribuidores comunitários tinham que entregar seus relatórios no final do dia para o supervisor, que entregava para o distrito, depois era repassado para as províncias, e só então é que o Ministério recebia os dados,” conta Filipe Basílio, responsável pelo Monitoramento e Avaliação do programa em Nampula.Foi nesse cenário de desafios que a OMS aconselhou o país a inovar, pensando: e se pudéssemos reunir todos esses dados em um só lugar? E se os números pudessem se complementar e nos ajudassem a ver exatamente onde agir, quando agir e com que urgência? 

E assim começou a transformação digital para o Programa de Controlo da Malária. 

O primeiro passo foi, com apoio técnico da OMS e outros parceiros, desenvolver o Sistema Integrado de Informação de Malária (SIIM), um repositório digital que unificou dados de campanhas, supervisão, epidemiologia, entomologia e estoques. Pela primeira vez, Moçambique pôde ver o quadro completo em tempo real. 

E não parou por aí! Logo vieram os painéis de visualização, os dashboards, que tornaram as informações acessíveis até para aqueles sem experiencia com sistemas digitais. Dados antes escondidos em planilhas agora apareciam como gráficos claros, mapas interativos, alertas visuais. 

Dr. Baltazar Candrinho, director do programa, lembra do impacto inicial: “Com pouco tempo, já podíamos ver o que estava a acontecer no campo, enquanto a equipe ainda estava lá.” Supervisores começaram a receber informações em tempo quase real. Erros foram corrigidos de imediato. Decisões passaram a ser baseadas em evidências. 

Em 2023, o programa deu um passo ainda mais ambicioso: digitalizar as campanhas. Os dados agora eram coletados por tablets e enviados diretamente ao SIIM, mesmo em áreas sem conectividade, graças à função offline. À medida que o Ministério da Saúde avançava nessa implementação, a OMS seguia aconselhando e apoiando tecnicamente esse processo. O efeito foi imediato. As campanhas, que antes levavam até duas semanas, passaram a durar apenas cinco dias. Como? Porque agora era possível saber, com exatidão, quais comunidades já tinham sido atendidas e quais ainda estavam esperando. As equipes sabiam para onde ir, que insumos levar, e o que estava faltando. 

Com as coordenadas geográficas, a malária perdeu seu esconderijo. 

Mas como toda mudança, no início, houve resistência. Muitos agentes de campo estranharam os dispositivos e o novo jeito de trabalhar. O programa apostou na capacitação a partir dos guias e das recomendações da OMS: formou as províncias, que passaram a formar os distritos. Assim, o conhecimento circulava. 

Hoje, os profissionais estão não só familiarizados com o sistema, mas também orgulhosos de fazer parte dessa mudança. Sabem que estão construindo um modelo pioneiro, não só em Moçambique, mas no mundo. 

Para quem vive nas comunidades, a transformação pode ser sentida de forma direta. Mais pessoas estão sendo alcançadas, porque o mapeamento é mais preciso. Mais vidas estão sendo salvas, porque as decisões são mais rápidas. E mais recursos estão sendo bem utilizados, porque as imprecisões diminuíram drasticamente. 

O próximo desafio, segundo Dr. Candrinho, é levar o uso ativo dos dados para os níveis mais locais: distritos e províncias. Ensinar os gestores a não só a coletar, mas também interpretar e agir com base nas informações disponíveis. 

E há planos ainda mais ousados: pagamentos digitais para as equipes de campo, expansão para outros programas como doenças tropicais negligenciadas, e o fortalecimento da supervisão remota. 

Hoje, Dr. Candrinho afirma: “Não temos mais como voltar atrás.” A digitalização trouxe mais do que eficiência, trouxe visão, controlo e conectividade. Moçambique, junto com a OMS e demais parceiros, mostrou que inovação, quando colocada a serviço da saúde pública, pode optimizar a vida das comunidades, e que, quando os dados estão disponíveis de forma precisa, ágil e de fácil análise, é a população quem mais tem a ganhar. 

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